Moral, ética e super-heróis

batman-armaPorque tudo o que aprendi sobre moral e ética eu aprendi com super-heróis.

Ok, isso não é verdade. E, mesmo se fosse, eu jamais diria isso em tom de orgulho, como em diversas afirmações similares como eu sei mais sobre a história de Westeros do que do Brasil e tantas outras que circulam nos fóruns e redes sociais da vida.

O que não significa dizer que não aprendi nada sobre ética e moral com super-heróis. Aprendi muito. Arrisco dizer que aprendi tanto quanto aprendi nas aulas de Humanidades. Porém, tão importante quanto a experiência da fruição das narrativas de super-heróis foi a reflexão sobre essa experiência. E sem as ferramentas proporcionadas pela educação formal em Filosofia, Sociologia, História e demais disciplinas, tal reflexão seria extremamente limitada, se não impossível – pelo menos para mim.

Deixando de lado as abordagens filosoficamente mais ousadas sobre ética e moral (como as de Nietzsche, Foucault e afins) podemos dizer que moral é o conjunto de regras que determinam o comportamento dos indivíduos em um grupo. Já a ética é o ponto de vista particularizado diante dessas regras. Portanto, o agir ético pode implicar em atos ilegais e imorais.

*********A seguir spoilers sobre o filme do Doutor Estranho*********

No recente filme do Doutor Estranho (clique aqui para conhecer a minha opinião sobre o filme) havia uma espécie de regra moral entre os magos, a proibição do dreno de energia da Dimensão Negra. No entanto, a Anciã, líder dos magos, drenava a energia da dimensão profana para proteger a Terra, agindo assim de maneira ética e, no entanto, imoral.

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O descobrimento da transgressão da Anciã levou Mordo a romper com os magos, um claro exemplo de um indivíduo que é incapaz de fazer uma reflexão ética a respeito da regra moral. A fixação ao paradigma moral é tanta que, ao final do filme, Mordo começa a caçar magos que drenavam energia da Dimensão Negra, mesmo sem fazer mal nenhum à Terra ou aos seus habitantes.

********Fim dos spoilers.********

Mas isso não quer dizer que todo ato ético é, necessariamente, imoral. No entanto, o agir moral passa pela aceitação livre e consciente das normas moralmente impostas. Tomemos como exemplo o Batman.

Resquício da Era de Prata e de seu Comics Code Authority , foi estabelecida a convenção de que super-heróis não matam e mesmo que a criação do Homem-Morcego seja anterior à Era de Prata e ao CCA, ficamos com essa ideia de que esse personagem não mata, pois, segundo uma das explicações mais utilizadas ao longo de seus mais de 70 anos, matar significaria igualar-se aos assassinos de seus pais.

Portanto, Batman, ao escolher não matar acata conscientemente uma normal moral, e, portanto, seu agir é tão ético quanto o da Anciã no exemplo acima, e também moralmente correto e aceitável.

Gotham-Bruce-Wayne

O agir ético pode ser moral ou imoral, desde que passe por uma reflexão profunda, desde que não abdiquemos de pensar sobre nossos atos. Aliás, é o eximir-se dessa responsabilidade que leva ao perigo da banalidade do mal.

Quando Hannah Arendt observou o julgamento do carrasco alemão Eichmann foi precisamente isso que a chocou. Sua defesa centrava-se no ponto de que ele apenas cumpria ordens, abrindo mão de qualquer reflexão sobre seus atos, isentando-se da responsabilidade sobre eles. Um homem absolutamente comum que cometeu as maiores atrocidades sem remorso ou prazer. A banalidade do mal, pura e simples.

De alguma forma a discussão sobre moral e ética permeia as narrativas de super-heróis, no entanto, só adquirem a devida dimensão após uma reflexão sobre elas, que só pode vir após a fruição, após a catarse que toda (boa) narrativa provoca.

Tão importante quanto não abdicarmos da reflexão sobre nossos atos é a reflexão sobre essas narrativas, daí o mote aqui dos Quadrinheiros: diversão e rigor.

That’s all folks.

Sobre Nerdbully

AKA Bruno Andreotti; Historiador e Mestre do Zen Nerdismo
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6 respostas para Moral, ética e super-heróis

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