Os Inumanos eram a nova minoria perseguida da Marvel, mas a volta dos X-Men mudaram mais uma vez o destino do grupo. Ou será que esse era o plano?
Branding é estratégia, um planejamento que é mais do que só o logotipo ou a identidade visual de um produto. A intenção de um projeto integral de Branding é alcançar uma posição única na mente e no coração do consumidor, e esse tipo de projeto serve para pessoas, marcas, empresas e histórias em quadrinhos.
Os Inumanos da Marvel são um caso recente de branding mal feito. Apesar do sucesso da Ms. Marvel / Kamala Khan, que ganhou seus poderes graças às névoas terrígenas, dentro da linha narrativa dos Inumanos, as vendas do título principal do grupo de heróis está em queda livre. Os erros de branding que explicam esse insucesso são 3: a falta de uma marca visual forte, a estratégia de comparar o produto a seu principal concorrente, os X-Men, e a repetição do erro estratégico que enfraqueceu o concorrente e levou a Marvel a escolher os Inumanos como substituto.
Começando pela marca visual forte, o título dos Inumanos não têm uma representação tipográfica icônica e reconhecível. Grant Morrison no livro Pop Magic fala sobre a importância de um símbolo gráfico:
“Selos corporativos são como garanhões. Eles fecundam o espaço imaginativo genérico. Eles invadem a Praça Vermelha, infestam as ruas insalubres do Tibete, eles deixam seu desenho em penteados. Eles se reproduzem em roupas, transformando as pessoas em peças publicitárias. Eles são um desenvolvimento muito poderoso na história da magia do selo, que remonta ao primeiro bisão desenhado na primeira parede da caverna.” (Para saber mais sobre os selos da Pop Magic de Morrison, clique aqui).
Títulos de sucesso como X-Men e Homem-Aranha têm identidades visuais que dialogam com as narrativas e os personagens que representam. O logo dos X-Men, por exemplo é em perspectiva (como se o X estivesse mais perto do leitor do que o Men), e isso leva a uma série de interpretações possíveis, como a intenção da narrativa de nos mostrar diferentes pontos de vista, do fator X ser algo mais próximo de nós do que imaginamos etc. O logo do Homem-Aranha dá a sensação de estar pendurado, em balanço, prestes a se soltar e cair. De novo temos diversas possibilidades de significado. Os Inumanos não têm isso. A identidade do grupo é muito genérica e de difícil ressonância com o público.
A questão da comparação com o principal concorrente precisa de uma contextualização. A Marvel vendeu os direitos dos X-Men para a indústria cinematográfica no final do século passado por causa de problemas financeiros. Agora, como a própria Marvel produz filmes bilionários, tudo que ela quer é ter de volta seus produtos mais famosos. A estratégia no caso do Homem-Aranha foi fazer um acordo e dividir os lucros. No caso dos X-Men a Marvel optou por estrangular a franquia. A saga Dinastia M que dizimou a população mutante, reduzindo radicalmente o número de personagens, fez parte dessa estratégia.
Por serem uma minoria perseguida, a raça liderada pelo casal Raio Negro e Medusa concorre diretamente com os mutantes. Eles brigam pelo mesmo conceito no coração do público leitor, mas o plano da Marvel foi comparar esses dois títulos, usando inclusive o mesma palavra – UNCANNY – que sempre foi associada aos X-Men, para marcar o título dos Inumanos. Agora a Marvel planeja revitalizar os mutantes com a fase ResurrXion. A mesma saga vai reorganizar os Inumanos. Vamos ver quem sobrevive…
O terceiro erro estratégico tem relação com o enfraquecimento do conceito chave dos X-Men no final da década de 1990 que vivia uma proliferação descontrolada de novos personagens e novos títulos mutantes. Esse fenômeno se explicava na época pelo sucesso de vendas da franquia, e pelas brigas internas dos autores/artistas por reconhecimento e remuneração. Naquele momento a Marvel definiu que os artistas que criassem novos personagens ganhariam um incentivo financeiro, como uma forma de apaziguar os ânimos dos seus empregados que exigiam uma participação maior nos lucros. O resultado de todo esse contexto é que o conceito de minoria perseguida foi enfraquecendo.
Agora com os Inumanos, antes mesmo de se consolidar como um título sobre uma minoria perseguida, já houve uma explosão de novos personagens e de novos títulos. Isso faz com que o público, que hoje é mais difuso, diverso e inconstante, se comparado a 20 anos atrás, não crie uma conexão com o título. A franquia não decolou, mas a Marvel já se antecipou em anunciar uma série de TV dos heróis, apoiada no sucesso de Agentes da Shield, que tem relação direta com esse título.
Talvez a série de TV impulsione os quadrinhos, talvez até a estreia da série a Marvel corrija alguns desses erros de posicionamento de marca. Como os X-Men tem um branding mais sólido, esse cruzamento entre os dois produtos, a constante comparação, e a falta de um conceito distinto, vai levar os Inumanos a um papel cada vez menor. Pelo menos do ponto de vista do marketing, essa é a aposta mais certeira.
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