Heróis morrem. Se tomarmos como referência o ciclo heroico (etapas nas quais os heróis de todas as mitologias passam) de Joseph Campbell a morte está ali, como uma espécie de redenção ou ascensão do herói. Por motivos muito menos escrupulosos, super-heróis também morrem, mas não por muito tempo.
Creio que o primeiro marco nesse sentido seja a morte de Barry Allen em Crise nas Infinitas Terras. O segundo Flash morre como um verdadeiro herói: impedindo o Anti-Monitor (o grande vilão dessa Crise) de destruir a Terra, sacrificando-se em prol de algo maior.
A Supergirl também morreu durante essa Crise para salvar o Superman e impedir o multiverso da destruição, mas apesar da imagem emblemática… Bom, não chegou nem perto do impacto do Velocista Escarlate.
A morte de Barry Allen é uma exceção entre as mortes de heróis: ela teve um significado. Por muitos anos ela foi considerada definitiva até Geoff Johns ter a “brilhante” (entendeu as aspas, né?) ideia de trazê-lo de volta. Sua morte teve um sentido, mas sua volta, não. Tanto é que uma das críticas mais comuns (e verdadeiras) é que esse Barry Allen acabou incorporando traços da personalidade do Wally West, o terceiro Flash. Um exemplo de como fanboys podem acabar com os quadrinhos. Mas vamos deixar isso para outro dia.
Os anos passam e eis que decidem matar o Superman. Um novo vilão foi especialmente criado para a tarefa: Apocalypse. Uma batalha sem sentido nenhum nas ruas de Metrópolis e o Homem do Amanhã estava morto. Simples assim. Sem sentido assim. Mal o corpo do herói esfriava e já havia quatro candidatos para tomar seu lugar (Aço, Erradicador, Superboy e o Superciborgue). Óbvio que essa “morte” não seria duradoura e mais ou menos um ano depois o Super já estava de volta. Ele só estava aparentemente morto, se recuperando. Porra, o que você queria? É o Superman! O fato é que a saga rendeu para a DC, vendendo como água e atraindo novos leitores. Parece que temos um regra de ouro nos quadrinhos mainstream: quanto pior, melhor.
Logo em seguida veio a morte do Lanterna Verde Hal Jordan, um dos personagens mais superestimados dos quadrinhos. Ensandecido ao ver Coast City, sua cidade natal, totalmente destruída parte numa cruzada de vingança e acaba adquirindo poder suficiente para refazer um simulacro de sua cidade, mas acaba sendo repreendido e julgado pelos Guardiões de Oa (aqueles smurfs que mandam nos Lanternas). Considerado culpado por usar seu anel para fins pessoais (é, parece que não é só no Brasil que as pessoas têm dificuldade de separar o público do privado) novamente fica louco e decide matar toda a Tropa e os Guardiões, absorvendo o poder da bateria central e se tornando a entidade conhecida como Parallax. É nessa época que a Tropa fica reduzida a Kyle Rayner e apenas um Guardião: Gunthet.
Mas a merda não para por aí não. Não bastava cagar num personagem querido dos leitores, tinha que piorar. Hal Jordan também passou por uma época fundido com a entidade conhecida como Espectro, que é o Espírito da Vingança, antes de ser ressuscitado por ninguém menos que Geoff Johns. A desculpa? Não foi o Hal Jordan que fez toda a merda citada e sim uma entidade conhecida como Parallax, que era uma impureza dentro da bateria central dos Lanternas, Medo escondido ali e que ninguém tinha percebido até então. E voltamos à nossa regra: quando pior, melhor.
Muitos outros super-heróis já estiveram do lado de lá e voltaram: Arqueiro Verde, Capitão América, Caçador de Marte e por aí vai. Todas as idas e vindas acompanhadas de estardalhaços midiáticos, espasmos de fãs e aumento de vendas. E claro que um dos personagens mais populares dos quadrinhos não ia ficar de fora dessa: o Batman.
Nas mãos de Grant Morrison Batman enfrentou a morte. Diferente das outras mortes esta fazia parte da proposta do roteirista para o personagem desde o início, não era apenas uma maneira de aumentar as vendas, era, também, uma boa história: o que aconteceria se TODAS as histórias do Batman fizessem parte de sua cronologia?
Durante essa fase vemos personagens e referências obscuras das antigas Eras aparecerem como velhos conhecidos dos leitores sem abrir mão de inovações ao personagem: seu filho Damian. Tudo isso culmina com a morte do Batman pelo Darkseid com uma arma (sim, de acordo com Morrison: o ciclo do Batman começa com a arma que matou seus pais e termina com a arma que destrói a essência do Mal, Darkseid), durante a Crise Final, ao mesmo tempo que Darkseid não apenas o mata, mas o aprisiona na Sanção Ômega – onde se vive várias vidas e mortes infinitamente. Ao fazer isso Morrison incorporou todas as versões alternativas e elseworlds na cronologia do personagem. Óbvio que o Cavaleiro das Trevas encontra um jeito de escapar e voltar triunfante, mas chega de spoilers por hoje.
A morte de Batman encerra um ciclo e sua volta inicia outro, como nas mitologias, golpe de mestre do roteirista, que sabe que aumento de vendas não precisa ser necessariamente sinônimo de histórias ruins e sem sentido e que o eterno retorno do mesmo deve continuar na indústria dos quadrinhos.
Esse ponto e vista realmente serve de reflexão!
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Essa idéia da DC que ficar matando os personagens é uma droga! E ficar estragando as histórias também tudo isso por puro mercenarismo que querer aumentar as vendas, ahh vai pra porra viu!! Esse quanto mais pior melhor é osso porque nem todo mundo gosta desses exageros
Eu sempre digo: boas histórias têm fim. Essa continuidade infinita dá nisso.
Há duas décadas parei de ler publicações regulares de heróis porque acho que deram tudo que haviam de dar até meados dos anos 80. O fim para mim foi A Queda de Murdock, Hulk cinza, Thor de Walter Simonson, Crise nas Infinitas Terras, A Saga das Trevas Eternas, A Piada Mortal, O Monstro do Pântano de Alan Moore e Jon Totleben, Batman Ano Um de Miller e Mazuchelli e por aí vai, apenas para citar algumas, todas encerrando com chave de ouro o ciclo de boas histórias da Marvel e da DC. Depois disso seria de fato o fim mais que bem-vindo da era dos quadrinhos…
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O post deveria ter o título “Super-Heróis da DC morrem…” já que, tirando uma menção “honrosa” ao Capitão América, só foram citados personagens da DC. Aí eu pergunto: e a Jean Grey? o Bucky? o Thor? e assim por diante.
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