Jogos multiplayer versus narrativos: a estagnação de uma indústria

Os jogos com foco em multiplayer matarão os narrativos?

Os videogames passam por constantes transformações. Desde a invenção do joystick até os games em realidade virtual. Com a evolução tanto da tecnologia quanto das técnicas utilizadas, foram criados jogos com focos diferentes, alguns narrativos e outros focados em multiplayer. Jogos narrativos são games que possuem foco em contar uma história, portanto possuem muitos diálogos e textos para o jogador acompanhar. Em games focados em multiplayer, o jogador é colocado em uma arena com outros jogadores que precisam disputar algo, muitas vezes sem uma história, apenas uma disputa para saber quem mata mais, quem domina mais territórios, etc.

A sétima geração de consoles (PS3, Xbox 360) obteve vendas notáveis para jogos que possuem foco em multiplayer, como as franquias Call of Duty e Battlefield e isso pode prejudicar a indústria.

No final de 2017 a EA (Eletronic Arts) fechou seu estúdio Visceral Games, que estava produzindo um jogo focado em narrativa para Star Wars. A empresa alegou que atualmente jogos lineares focados em narrativa não conseguem alcançar bons números de vendas, pois não são o que os jogadores procuram. Blake Jorgensen, diretor financeiro da EA, fez a seguinte afirmação durante uma apresentação aos investidores da empresa

“Conforme continuávamos revendo o jogo, ele se parecia cada vez mais como um jogo mais linear do que as pessoas gostariam hoje, como gostavam há cinco anos ou dez anos”

Observando a marca de 1,5 bilhão de dólares em 3 dias de Call of Duty WW2, essa afirmação parece coerente. Porém o ano de 2018 provou o contrário para a EA. Voltando a Star Wars, a empresa lançou dois jogos da franquia focados em multiplayer, Battlefront 1 e 2, o primeiro não possui nenhum tipo de campanha e parece uma adaptação de Battlefield para o universo dos Jedi. O game baseia-se em partidas comuns de First Person Shooter (Atirador em Primeira Pessoa – FPS), contendo modos de jogo que colocam os protagonistas dos filmes originais contra um exército de outros jogadores Stormtroopers, com veículos e campos enormes.

O maior problema de Star Wars: Battlefront 2 não foi repetir a fórmula enjoativa de seu antecessor., mas sim o sistema de loot boxes, onde além de pagar o valor base do jogo (200 reais no Brasil) era necessário comprar caixas em que você paga um valor X e precisa torcer para vir um item que você deseja. O jogo foi rechaçado por crítica, público e falhou em vendas tendo seu preço rapidamente cortado e as loot boxes abandonadas. Apesar de tudo isso, não foi o suficiente para transformar Battlefront 2 em um sucesso.

Em meio às críticas da EA aos jogos lineares, estávamos próximos de um dos maiores lançamentos de 2018, God of War (PS4), um game completamente linear e focado na narrativa. O jogo não possui nada relacionado a multiplayer, até porque quando a franquia tentou aventurar-se nisso em God of War: Ascension, tiveram o game pior avaliado e menos lucrativo da franquia.

O diretor de God of War, Cory Barlog criticou a EA quanto ao “problema” dos jogos lineares: “oh, meu Deus EA, que nonsense absoluto!” “Eu adoro jogos single player lineares. Me entristece quando a palavra linear é considerada algo ruim…” 

God of War foi um sucesso absoluto de vendas, conseguindo a marca de 3,1 milhões de cópias em três dias, que para um jogo exclusivo de uma única plataforma torna o número ainda mais impressionante. As técnicas narrativas utilizadas no jogo, o desenvolvimento do personagem e o gameplay envolvente tornaram o game um sucesso instantâneo. Crítica e público aclamaram a nova aventura de Kratos e o jogo é de uma qualidade tão diferenciada que possui a capacidade de influenciar o usuário na hora de decidir qual plataforma comprará.

O fracasso de Battlefront e o sucesso de God of War não significa que jogos multiplayer são ruins e games focados em narrativa são bons. O ponto é que existem estilos diferentes de jogadores, porém nenhum deles ignora a qualidade do produto que estão consumindo. Mafia 3 apresenta uma excelente história, porém seu gameplay repetitivo matou as vendas do jogo e Battlefield 1 com seu multiplayer gigantesco criou a tendência de revisitar a temática das duas grandes guerras mundiais nos videogames de oitava geração (Xbox One e PS4).

Tanto a colocação, quanto a decisão da EA de fechar a Visceral Games, foi infeliz. Era uma chance da própria Eletronic Arts variar seu catálogo de jogos que a cada dia resume-se mais a FPS e esportes, e a falta de opções começa a tornar-se um problema nos videogames. O exemplo disso é que jogos multiplayer de zumbis praticamente desapareceram nos últimos anos, pois tornaram-se excessivos na geração anterior e de todas as franquias multiplayer de zumbis, a única que teve uma continuação anunciada foi Dying Light.

A comunidade procura qualidade e novas experiências, a novidade e tendência nos multiplayers são os battle royale (Jogos onde apenas o último sobrevivente em campo vence). Já nos games narrativos, o envolvimento emocional entre dois personagens anda sendo o foco, temos diversos exemplos como: The Last of Us, God of War e Life is Strange. Apesar desses dois estilos de jogos serem tendência, não significa que apenas eles farão sucesso, mas essas experiências são hoje o foco do mercado e o que anda chamando mais a atenção dos jogadores.

Talvez a empresa que tenha entendido melhor como encarar a indústria foi a Rockstar Games, que, ao lançar GTA V, entregou uma experiência narrativa louvável, a história é divertida e prende o jogador do início ao fim. Seu multiplayer até hoje é alimentado com novos conteúdos, possuindo vários modos de jogo e players ao redor do mundo. A união do game narrativo com o game multiplayer resultou no produto de entretenimento mais lucrativo da história.

A indústria está amadurecendo e descobrindo novas possibilidades diariamente. Existem jogadores para todo tipo de experiência no mercado, desde jogos indie 8-bits até multiplayers que colocam 64 jogadores simultâneos ao redor do mundo em uma única partida.

O ponto que fica é a preocupação quanto a termos apenas um tipo de experiência por uma imposição de algumas empresas de games que se limitam a tentar repetir a fórmula lucrativa de seus concorrentes. Próximo ao lançamento de Spiderman (PS4) é bom desmistificar um possível preconceito gerado em torno dos jogos narrativos, pois assim como Batman Arkham, essa pode ser uma experiência narrativa incrível – para os dispostos para tanto.

Sobre John Holland

Procurando significados em páginas de gibi enquanto viaja pelos trilhos do conhecimento e do metrô. Sempre disposto a discutir ideias e propagar os quadrinhos como forma de estudo, adora principalmente a Vertigo, está sempre disposto a conhecer novos quadrinhos e aprender o máximo de coisas possível!
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