Man of Steel: um Superman para o século XXI (com spoilers)

Man of Steel sem dúvida foi um dos filmes mais aguardados desse ano e, consequentemente, comentado, criticado, resenhado etc. No Omelete, as primeiras impressões saíram dia 10 de junho, 4 dias antes da estreia oficial (quem pode, pode).

Nós, meros mortais, tivemos que nos contentar com uma parca pré-estreia dia 28 de junho, mas a estreia oficial mesmo só ocorreu ontem, com quase 1 mês de atraso em relação aos EUA.

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Mas o fato é que o Superman está aí e todo mundo quis dar a sua opinião, seja ela disfarçada de crítica, resenha ou qualquer classificação que você queira dar para a sua. Seguindo o velho adágio que diz que opinião é igual bunda, todo mundo tem a sua e dá quem quer, vou dar a minha. Opinião, que fique bem claro.

Érico Borgo do Omelete deu 4 ovos para  Man of Steel, a mesma nota que deu para o ridículo Superman Returns de Bryan Singer, prova de que gosto não se discute, se lamenta. Na suas próprias palavras, a culpa do fracasso do filme de Singer foi a falta de “fisicalidade”, palavra que não consta no dicionário, mas trocando em miúdos quer dizer falta de PORRADA.

Achar que falta de porrada foi o problema no filme de Singer é querer tapar o sol com a peneira. O filme é bem intencionado ao tentar fazer uma homenagem aos filmes de Richard Donner, mas não passa disso. Uma boa ideia e uma péssima execução. Mas por que o filme é ruim afinal?

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Bryan Singer se recusou a atualizar o mito do Superman. Quis colocar o Superman do final da década de 70 e início da de 80 para o século XXI e fracassou de maneira retumbante. O malogro de Singer é a resposta ao sucesso de Snyder/Nolan: eles trouxeram o Superman definitivamente para o século XXI.

De todas as mudanças propostas para esse Superman do século XXI (o fato de não haver mais um triângulo amoroso entre Lois Lane, Clark Kent e Superman foi aparentemente perdoado pelos fãs) a mais polêmica foi sem dúvida o fato dele ter executado Zod. Os puristas já começaram a reclamar, mesmo o ocorrido tendo precedentes nas HQ’s, o mais famoso e clássico deles na fase de John Byrne, onde ele também mata Zod.

Por que tanta reclamação em relação a isso?

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Os filmes do Batman do Nolan e agora o Man of Steel têm um diferencial em relação aos filmes da Marvel: eles têm uma abordagem mais madura, mais adulta. Alguns confundem isso com realismo, o que é um tanto equivocado. A preocupação de Nolan não é tornar seus super-heróis reais, é menos mostrar que eles poderiam ser “de verdade” (ilusão relativamente fácil com o Batman, mas impossível com o Superman) do que mostrar que eles são críveis e esse é o ponto. Bom, o fato é que essa abordagem madura atrai um público igualmente maduro. Quem reclama do Superman ter matado são os fãs com cerca de 30 anos que têm como paradigma a Era de Prata, esquecendo-se que o Superman da Era de Ouro matava sem muitos problemas éticos ou morais em relação a isso.

Esse é um dos pontos-chaves do filme: a moral do Homem de Aço. Em determinado momento Faora diz que é a moralidade do Superman que o torna fraco e, consequentemente, a amoralidade dos outros kryptonianos os tornariam superiores do ponto de vista evolutivo. Mas o Superman do filme é imoral porque Mata? De maneira nenhuma.

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Na cena em que o vemos sendo vítima de bullying, o então menino Clark Kent está lendo Platão, e o filósofo é bem claro a respeito da pena de morte em As Leis:

“Se algum cidadão é surpreendido em semelhante crime (roubar uma coisa sagrada), e que haja cometido contra os deuses, contra seus pais, ou contra o Estado, qualquer destas faltas enormes, nas quais não se pode pensar sem horror, o juiz, tendo em conta a educação excelente que ele (o réu) tenha recebido desde a infância, a qual, no entanto, não lhe adiantou para que se apartasse dos maiores crimes, lhe considerará como um enfermo incurável e seu castigo será a morte, o menor dos males para ele. Ele servirá de exemplo aos demais quando virem sua memória desonrada e seu cadáver lançado bem longe, fora dos limites do Estado”.

Ou ainda em A República:

“A melhor depuração é dolorosa, como todos os medicamentos efetivamente eficazes [são amargos]: é aquela que arrasta as punições por meio da justiça associada à vingança, esta coroando com o exílio ou a morte; essa depuração, via de regra, afasta os maiores criminosos que são irrecuperáveis e causadores de sérios danos ao Estado”.

Apesar do responsável pela decisão da execução de Zod pelo Superman (já vi várias entrevistas, uma dizendo que foi o Goyer e outra o Snyder, sendo que Nolan supostamente foi contra) ser um tanto nebuloso, ficou bem claro no roteiro: não havia mais como mandar Zod para a Zona Fantasma e ele está prestes a matar uma família inocente. Não houve saída para o Super a não ser matá-lo e nesse momento ele está aliando a Justiça pelos crimes cometidos pelo general com a Vingança pela morte de seu pai, Jor-El. Superman naquele momento toma uma decisão tanto Moral (ao matar Zod ele protege o Estado e seus cidadãos) quanto Ética (o ponto de vista particularizado do indivíduo frente à Moral).

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Ao que parece nem mesmo o diretor do filme entendeu totalmente as implicações do ocorrido (mas ok, uma obra de arte escapa até mesmo de seu autor) quando diz que:

“Ao optar pelos humanos em detrimento dos kryptonianos, de certa forma ele nunca desrespeitou as leis terrestres. Zod é um alienígena e não temos leis para o assassinato de nada não-humano na Terra. Tecnicamente é um truque nosso com o cânone“.

Como se o problema fosse meramente desrespeitar uma lei e não tirar uma vida. Mas, quando o Superman o faz é visando a preservação da Cidade, ele é o filósofo-rei de Platão.

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Pode-se e deve-se pensar no que significa um mundo que quer um Superman executor. Em O Reino do Amanhã surge um novo herói em Metrópolis, Magog. Ele é brutal, ele mata, ele é o que as pessoas querem. Lembremos as palavras de Magog ao Superman:

“Pensa bem. Foi você que se deixou afetar pelo homem da rua. Vox Populi, cara! Abaixo o velho, viva o novo, mais brilhante, mais rápido, mais cruel. O modelo do próximo ano. Foi isso que a multidão sempre quis. (…) O escoteiro mais velho do mundo… mas você não mudava. Não se atualizava, não evoluía com os tempos. (…) O mundo mudou… mas você, não. Por isso eles me escolheram. Escolheram o que matava em vez do que não matava…”.

Sou um fã do Super da velha guarda. Também me incomodou a morte de Zod, mas dizer simplesmente “O Superman não mata” é ignorar a historicidade do personagem, condená-lo ao museu. Os mitos têm várias versões e devem se adaptar às necessidades de uma sociedade para não morrer. Não há como negar, os tempos mudaram e o Superman tinha uma escolha: matar ou morrer.

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Sobre Nerdbully

AKA Bruno Andreotti; Historiador e Mestre do Zen Nerdismo
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22 respostas para Man of Steel: um Superman para o século XXI (com spoilers)

  1. Velho Quadrinheiro disse:

    Nada a acrescentar.
    Endosso tudo dito aqui.

  2. Olavo Lima disse:

    O znyder é um péssimo diretor só ver a saga do leonidas corno e a esposa que ele impos em 300 que não estava na hq ou sua direção que mudava do meio para o final de watchmen,nesse filme mostra toda sua idiotice e arrogância,mas acho um filme muito bom,znyder recentemente admitiu publicamente que toda a cena do final foi criada por ele e originalmente zod iria com os outros para a zona fantasma,mas é um filme muito bom pelo roteiro original,mas como você disse o super dos anos 30 é o original mas não o que fez mais sucesso,o da reformulação dos anos 70 e do filme clássico onde o super é evangélico fez muito mais e virou a visão “oficial”dele o que afetou muitos fãs

  3. Fábio M disse:

    É um bom filme…mas deixou a desejar…é uma mescla de Superman 2 com Superman o retorno minha nota é 05,abraço!

  4. É como na vida real meu velho… algumas pessoas tem mais consideração pela vida do criminoso, do que pela vida e bem estar das vitimas… exemplo: menores que cometem crimes e ateiam fogo nas vitimas… é punido com uma ridicula medida sócio educativa… se o Gaucho Negro matar um criminoso: Tirem esse perigo das ruas, ele é um monstro!!!!!!!!!!!! É como digo: quem preserva o lobo, sacrifica as ovelhas….

  5. Não gosto nada do Nolan, ele parece não entender o mundo da HQ, isso de querer fazer que esses super heróis pareçam factíveis, se ele “conseguiu” com o Batman, com o SM ele não conseguiu, seria difícil, afinal o cara vem de outro planeta, voa e o cacete a quatro.
    Parece até que o MalaNolan e Goyer tentaram, mas perderam longe pra porradaria, a interferência da dupla não foi excessiva e nem deu pra interferir tanto no filme, continuo não gostando da tentativa da dupla de explicar tudo, mesmo quando é óbvio e nesse filme aconteceu disso algumas vezes, particularmente com o Clark em sua infância e juventude, felizmente não contaminou o filme.
    Quando à morte, acho absolutamente natural tal característica quando se faz um reboot ou upgrade de qualquer personagem.
    Aliás, no cinema americano a morte e sexo sempre são sempre algo épico, cinematográficos pacaraio, acho que a morte mais chocante pra mim quando vi pela primeira vez é a morte em Bonnie & Clyde do Arthur Penn.

  6. Grande texto. De grande relevância a analogia que você fez com Platão. SPOILERS: Sou fã do Superman, não faço parte da geração oitentista que acompanhou o voo de Christopher Reeve e seu Superman escoteiro. Acredito que é muito difícil para os fãs mais antigos aceitarem essa versão contemporânea do personagem, ainda mais para um filme que, em função do realismo, estabelece tantas mudanças na mitologia do super-herói. Todavia, ainda sim, como leitor assíduo das HQs, eu gostei das mudanças, do novo tom, da humanização e da cena polêmica. É lógico que o Superman mata. Ele tem seu código de moral, seu senso de justiça; porém, sempre existiram exceções dentro dos seus arcos de histórias que o levaram ao homicídio. Dizer que o Superman não mata é desconhecer completamente seu Universo. Em O Homem de Aço, o clímax com o Zod vai além de mostrar apenas que um super-herói, às vezes, precisa matar. Passamos o filme inteiro diante de um Clark Kent inseguro, perdido, tentando se descobrir e entender o próprio mundo. Passamos a narrativa inteira acompanhando um Clark que, embora seja um kryptoniano, cresceu e fora concebido como um humano. O Superman acaba de descobrir sua origem e seus superpoderes, acho que é muito óbvio não esperar o farol de justiça do Superman tradicional. E não entendo essas críticas que ele não se importa com a população de Metrópolis, de Smallville, que não evoca preocupação com a destruição por parte do exército do Zod. O cara salva um militar, pede para as pessoas entrarem “porque na rua não é seguro”. Na cena do Terraformando, o cara está lá no Índico, do outro lado do planeta, tentando destruir uma das naves kryptonianas e, ainda assim, queriam que ele estivesse lá em Metrópolis, concomitantemente, para salvar a população? Na batalha contra o Zod, Kal-El estava mais apanhando do que qualquer outra coisa, como salvar os prédios desabando e as pessoas por ali? Quando ele leva Zod para o núcleo de Smallville, seu ato é completamente impulsivo, humano, desesperado. Zod estava ameaçando sua mãe, seu tesouro e o que restou de sua vida. Queriam ainda que ele pensasse com a cabeça fria, bolasse um plano enquanto sua mãe estava ali prestes a morrer? Tudo é justificável, mas se o roteiro ainda não convence, é só lembrar dos argumentos: é um reboot, um filme de ORIGEM, de construção, de um Superman humanizado; Clark Kent acaba de descobrir que é um super-herói. Em outras palavras, estamos diante de um Superman inexperiente, e que ainda por cima precisa fazer a difícil escolha entre salvar a humanidade ou resgatar seu antigo povo. Esse dilema está simbolizado no clímax: quando o Super quebra o pescoço do Zod, a família ali corresponde a humanidade, ao passo que o Zod simboliza Krypton. Lembrem-se dos conselhos de Jonathan Kent, de que um dia que ele teria que fazer uma escolha, a qual refletiria como um orgulho (ou não) ante a humanidade. Lembrem-se do conselho do Padre: que antes é preciso dar um voto de fé e que a confiança vem depois. No final Superman acaba escolhendo a Terra e, para isso, infelizmente precisou matar o Zod. Primeiro, porque ele não tinha escolha. Segundo, porque o Zod não desistiria de acabar com a Terra, visto que ele nasceu para proteger Krypton. Pra mim o clímax é a alma do filme e o símbolo de todas as reflexões do filme – metáfora messiânica, escolhas, esperanças. E no fim ele escolheu a Terra, pois “Krypton teve sua chance”.

  7. Esse mimimi todo não muda o fato que o filme é uma bosta.

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  9. O filme foi muito bom sim, muito bem adaptado, o suficiente para dar uma reavivada num personagem que estava apagado desde de os anos 80 e garantir uma continuação, aos velhos saudosistas incapazes de entender e apreciar algo bem feito para gerações atuais, vocês lógico tem todo direito de dar suas opiniões, mesmo que elas sejam relevantes a três décadas atrás.
    Que venha o novo!

  10. Samuel Pacheco disse:

    Eu me lembro que no filme “Superman II” o personagem também mata o Zod.

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