Uma questão com respostas para além do mundo acadêmico.
Ao se debruçarem sobre uma definição sobre histórias em quadrinhos, criadores podem ter indicações valiosas de como expandir o meio, levá-lo ao seu limite e superá-lo. Muitos não se contentaram em criá-los, mas pensá-los, mostrar o que os faz únicos, o que os aparta de outras formas de arte etc.
Ao compreender melhor o que quadrinhos são, consumidores podem reconhecer quando uma obra inova ou se mantém tradicional em relação ao meio, ampliando o repertório e consequentemente intensificando a fruição de uma obra.
Seja qual foi o motivo que lhe trouxe aqui, seguem cinco definições de histórias em quadrinhos, assim organizadas: autor, livro em que a definição aparece, ano da publicação original, definição na obra e breve comentário sobre. Os links remetem às obras consultadas.
Antonio Luiz Cagnin, Os Quadrinhos – Linguagem e Semiótica (1975)
“[Quadrinhos são] um sistema de história narrada com imagens em sequência” (Edição de 2014, p.31).
Um dos pioneiros em pesquisa acadêmica de histórias em quadrinhos no Brasil, o livro de Cagnin objetivou estabelecer uma gramática elementar dos quadrinhos.
Will Eisner; Narrativas Gráficas (1986)
“As histórias em quadrinhos são, essencialmente, um meio visual composto por imagens. Apesar das palavras serem um componente vital, a maior dependência para descrição e narração está em imagens entendidas universalmente, moldadas com a intenção de imitar ou exagerar a realidade. (…) Apesar da grande visibilidade e atenção compelida pelo trabalho artístico, insisto em afirmar que a história é o componente crítico de uma revista em quadrinhos (…). No entanto, as histórias em quadrinhos são, ao mesmo tempo, uma forma de arte e de literatura e, em seu processo de amadurecimento, buscam reconhecimento como um meio ‘legítimo’”. (p.5-6).
Eisner (também célebre autor de histórias em quadrinhos) aponta a centralidade da interação entre imagem e texto escrito (assim como Cagnin) e para a importância da história que está sendo narrada no meio. Interessante é que no momento ele também entendia as histórias em quadrinhos como literatura. Atualmente, alguns estudiosos defendem que entender as histórias em quadrinhos como literatura é um modo de menosprezá-la, ainda que normalmente quem faz tal comparação queira justamente valorizar os quadrinhos, como é o caso de Eisner.
Em essência o argumento é que ao dizer que quadrinhos são literatura nega-se sua especificidade como meio e forma de arte autônoma. No entanto, essa comparação e sua superação estão dentro do processo de busca por reconhecimento legítimo que o próprio Eisner menciona.
Scott McLoud; Desvendando os Quadrinhos (1993)
Clássico dos clássicos, é impossível pensar o assunto sem passar por ele, nem que seja para discordar. O que é interessante é que McLoud também é criador e expôs sua obra teórica sobre quadrinhos em quadrinhos.
Thierry Groensteem, O Sistema dos Quadrinhos (1999)
“[Quadrinhos são] uma combinação original de uma (ou duas, junto com a escrita) matéria(s) da expressão e de um conjunto de códigos. É a razão pela qual podem ser descritos apenas em termos de sistema. (…) Nos quadrinhos, os códigos são construídos no interior de uma imagem de forma específica, que mantém a associação da imagem a uma cadeia narrativa onde as ligações se espalham pelo espaço, em co-presença” (p. 14-15).
Embora a obra seja do final dos anos 90, a tradução para o português é de 2015. A definição de Groensteem é interessante porque vai menos no sentido dos quadrinhos como linguagem (sem negá-lo, é claro) e mais na direção de um sistema, ou seja, um conjunto de elementos (que ele chamada de códigos) interdependentes, mas formando um todo organizado. Outro ponto digno de nota é que Groensteem parece confirmar muitos pontos estabelecidos por Cagnin, que também considerava os quadrinhos como um “sistema narrativo”, ainda que certamente não o tenha lido.
Barbara Postema, Estrutura Narrativa nos Quadrinhos (2018)
“[Quadrinhos são] um sistema em que o número de elementos ou fragmentos díspares trabalham juntos para criar um todo completo. Os elementos dos quadrinhos são parcialmente pictóricos, parcialmente textuais e, por vezes, um híbrido dos dois” (p. 15).
Nota-se que Postema assimilou criticamente todas as contribuições anteriores em seu livro, enfatizando em sua definição a dissonância entre os elementos que compõem uma história em quadrinhos.
E, se você quiser seguir nessa empreitada, aqui estão alguns vídeos:
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