Nos idos de 1988, quadrinhos haviam virado arte. Era com cara de arte que alguns deles eram vendidos em sofisticadas edições. Estas a editora Abril batizou de “Série Graphic Novel”. Os primeiros números traziam clássicos requintados: X-Men – O conflito de uma raça, O Demolidor de F. Miller e Bill Sienkiewz, O Capitão Marvel de Jim Starlin e Batman – A Piada Mortal. Mas a fina da cepa da vanguarda gráfica ficou para a edição de número 6: Homem de Ferro – Crash.
Bem diferente de hoje, em que o auê provocado por algum novo produto é fugaz (o “novo” iphone, o “novo” Batman, o “novo” BMW, são tão lembrados quanto aquilo que você almoçou na 6ª feira passada), Homem de Ferro – Crash manteve a posição de ícone dos quadrinhos por uns bons 5 ou 10 anos.
Não é pra pouco. A Graphic Novel 6 foi vendida como “A primeira graphic novel gerada por computador”. Numa década em que raríssimas pessoas tinham um computador em casa, Crash virou o símbolo do que um computador podia produzir nas mãos de artistas arrojados.
Pra quem lembra, os desenhos da revista são muito parecidos com os velhos jogos de cd-rom como Myst, Doom, King`s Quest e Full Throttle. Paisagens, personagens e objetos esculpidos em pixels imensos, mas que na época eram revolucionários.
A história da revista é ambientada no futuro, quando Tony Stark tem por volta de 74 anos, mas mantém uma impecável aparência jovem. Fiel às características do personagem, a juventude é resultado do novo vício do herói, uma droga chamada pepetuon, um retardador de envelhecimento sintético.
O enredo segue às voltas com o roubo e pirataria de informações. Interesses nacionais e a empresariais entram em choque, a SHIELD não tem meios para agir. Stark, um excêntrico recluso, bem parecido com certo cavaleiro das trevas, deve sair de seu casulo e vestir a versão mais moderna de sua armadura.
As características dessa vestimenta são tão detalhadas como o manual de instruções de um reator nuclear. É aí que reside o barato de Crash. Os autores potencializam tanto o que consideram ser avançado e moderno, que o resultado é um “futurismo retrô” em dose concentrada.
“Checagem dos sistemas de suporte somático: Sistema respiratório. Recuperadores diafonéticos. Nódulos intravenosos. Reservatório de solvente ótico. Microfones. Captador de reconhecimento de voz. Sistema de resfriamento. Vedadores de pressão. Aceleradores. Amortecedores de retroalimentação.” – páginas e páginas disso.
Crash, assim como praticamente todas as histórias do Homem de Ferro, é trágica. É a tensão insolúvel entre inovar e ser ultrapassado que determina a demasiada humana existência de Stark. A tragédia de Tony Stark é que ele sempre será superado, pelo tempo, pela tecnologia, pelos seus inimigos, pelo seu eu futuro, pelo que ele já foi e nunca mais será. Mas nem por isso ele deixa de tentar. Talvez daí o porquê de seu sucesso. Daí tantas vezes a mesma história ser contada como se fosse única.
Bom filme pra você neste fim de semana.
Umas das primeiras imagens que vieram a minha mente assim que anunciaram que sairia um filme do Homem de Ferro foi justamente os quadrinhos de GN, como todo o material para tornar o Sr. Tony Stark REAL já estava lá, pronto, bastando ao povo de Hollywood beber da fonte… Honestamente fiquei um pouco decepcionado ao não usarem alguns conceitos como por exemplo as “camadas” da armadura… De qualquer maneira o resultado foi muito bom, mas sinto que não aproveitaram todo seu “potencial”.