Sobre a origem fascista dos trajes de super-heróis.
O traje do super-herói é tão importante que Peter Coogan em seu Super Hero – The Secret Origin Of a Genre o elenca como uma das convenções que define tanto o personagem quanto o gênero, elemento central que da própria identidade do herói.
Coogan chama atenção para a importância das cores e do design dos uniformes. Como modelo, aponta o traje do Superman, estampado na capa de Action Comics #1 (1938), emblemático ao definir a identidade do herói e sua influência a ponto de todos os super-heróis que vieram depois (e muitos que surgiram antes) adotarem trajes que também marcariam de maneira indelével suas identidades.
Um elemento de extrema importância no traje do Superman é o icônico “S” em seu peito, que mais tarde seria identificado como o escudo da casa de El, da qual descende o Superman, significando “esperança”.
Pois bem, de acordo com Chris Gavaler em Super-Hero Comics, os primeiros personagens a apresentar um traje definidor de sua identidade com um símbolo no peito foram os Knight Hawks do livro The Clansman: A Historical Romance of the Ku Klux Klan (1905), de Thomas Dixon, segundo volume de uma trilogia composta por The Leopard’s Spots (1902) e The Traitor (1907), conhecida como The Ku Klux Klan Triology. Ali a KKK é apresentada como o grupo de heróis frente à ex-escravizados e membros da União (que lutaram contra os estados confederados do Sul) retratados como vilões.

Ilustração contida na primeira edição do livro.
O filme de D. W. Griffith, The Birth of a Nation (1915) é uma adaptação desse segundo livro. Os livros de Dixon e também o filme de Griffith, marco do cinema americano, faziam muito sucesso à época e, pode-se dizer, compunham o imaginário heroico dos Estados Unidos no período.
Embora Gavaler ressalte que já em 1949 a ligação direta entre os super-heróis e essa origem fascista (principalmente por conta da participação dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial) já estivesse completamente apagada, inclusive com o Superman chegando até a lutar contra a Klan em seu programa de rádio (e também recentemente), é importante relembrar esse elo entre as duas criações.

Data da capa: janeiro de 1942
Afinal, como recentemente mostrado no episódio 4 de Falcão e o Soltado Invernal pelas palavras do Barão Zemo: “O desejo de tornar-se super-humano não pode ser separado de ideais supremacistas”.
Ou pode?
É também oportuno trazer à tona Susan Sontag, relembrada em um texto recente pelo Velho Quadrinheiro:
A SS [organização paramilitar nazista] foi planejada como uma comunidade militar de elite que não era apenas supremamente violenta, mas também supremamente bela. […] Os uniformes da SS eram elegantes, bem cortados, com um toque (porém não excessivo) de excentricidade.
Ainda que seja possível argumentar que no caso do traje da Klan trate-se mais de um uniforme, isto é, de algo que define a identidade do grupo e não do indivíduo, e menos de um traje, como é o caso dos super-heróis (ainda que com exceções, como os trajes de alguns super-grupos, como algumas fases dos X-Men ou mesmo na Tropa dos Lanternas Verdes)…
Supremamente violentos, supremamente belos…
O mesmo não poderia ser dito dos super-heróis e seus trajes?