Dos detalhes das linhas ao “vazio” das páginas!
Clover é um mangá criado e produzido pelo grupo CLAMP, composto por quatro integrantes, todas mulheres, Ôkawa Ageha, Mokona, Nekoi Tsubaki e Igarashi Satsuki.
Analisando o mangá Clover, de cara encontramos uma sobrecapa incomum. Ela é feita de papel vegetal transparente, onde se enxerga levemente a imagem da capa e alguns detalhes dos desenhos impressos na folha translúcida, indicador de delicadeza e suavidade, levando o leitor ao encontro com o ma, o entre-espaços. Pode-se pensar, estes espaços das imagens não preenchidas na sobrecapa também sugere o silêncio, uma reflexão para entender o momento seguinte que é a própria imagem da capa.
Na seção interna da sobrecapa, no que seria a orelha do livro, há pequenos e simples escritos na língua japonesa e, na outra orelha, a tradução na língua inglesa. Tratam-se da letra de uma música, cujos refrões, em alguns momentos, são repetidos nas páginas, interpretadas ora pela personagem cantora, Oruha, ora pela personagem principal Sue. A música dialoga com o silêncio dos protagonistas e conduz instantes reflexivos cedendo espaços como suspiros, ou seja, o silêncio tem a voz, tem significado. A poesia dos refrãos possibilita perceber o sentimento que envolve os personagens.
No interior da capa de cada mangá há uma imagem que se prolonga para o interior da contracapa, que só pode ser vista inteira pelo leitor no final da sua leitura. Entretanto, quando elas se completam, ele entende que o final da história está contido no interior da capa e contracapa, sendo que as imagens indicam como será o final da narrativa.
Em seguida, na apresentação do mangá, encontramos a palavra Clover e duas simples e singelas frases da personagem Oruha: “so take me someplace far away/ I want happiness”, que são comuns em todos os outros quatro mangás, mas cada um tem um símbolo diferente, abaixo da palavra Clover.
Depois da ilustração correspondente aos personagens aparece o índice dos títulos dos capítulos, que se apresenta com uma forma visual, supostamente proposital. São figuras que remetem à elementos orientais ou mais próximo da proposta, ou seja, à figura do ma.
O interior do mangá é preenchido predominantemente por branco e preto, linhas finas e os objetos, referentes a máquinas (fios e engrenagens), são extremamente detalhadas. Por um lado o leitor se depara com a simplicidade de traço, mas por outro ele encontra a riqueza das formas dos objetos construídos minuciosamente. Esta característica cyberpunk, muito comum em diversos mangás, traz nas páginas do Clover uma estética distinta, transformando o que seria um caos da tecnologia numa organização de linhas. Mas existe um momento que não se vê as linhas finas dos desenhos. Elas somem do corpo do personagem e se inclinam para uma “pausa” da ação, possibilitando também absorver a serenidade que ocorre naquele momento com o personagem.
Um outro instante que nos deparamos com o ma nas linhas, é quando alguns personagens transformam parte de seu corpo em máquina. A construção da máquina no corpo se dá lentamente, como se fossem câmeras cinematográficas e as linhas começam a dar forma à máquina, como um “entre-espaços”.
É comum neste mangá os diálogos tomarem conta dos quadrinhos, isto é, são colocados no lugar dos personagens e ficam num espaço reservado para eles, acompanhados algumas vezes de apêndice. A sequência dos capítulos, ademais, é muito peculiar. Como dito, os títulos lembram poemas e dentro da narrativa têm o mesmo valor. Surgem como poemas curtos e só se percebe a mudança de um capítulo para outro através do título, ou seja, não há uma ilustração que indique outro capítulo, a narrativa se mantém até o fim numa sequência, todavia apresenta pausas de uma ação a outra. Ora o título fica entre os quadros, ora se posiciona estendido na lateral da página, ora o quadrinho corta o título, ora ele interfere na mudança de cena para cena. Como geralmente o título são palavras simples, torna seu encontro com a narrativa um relacionamento sutil e refinado, texto e imagem compostos com um toque de poesia. Fica clara esta observação ao se perceber que no volume dois, do segundo capítulo para o terceiro, só há uma página de história.
Através dessa pequena análise do mangá Clover, podemos perceber que as meninas do CLAMP, sentiram a necessidade em explorar mais a composição e estética visual das artes nos mangás.