O quadrinho nacional é tão amaldiçoado que pra dar certo só fazendo um pacto com o cramulhão – e é isso mesmo que o coletivo Mamakoosa está fazendo.
Da cabeça do roteirista, diretor e produtor cultural Chico Paschoal e de Beto Dorneles, um dos criadores da TV Colosso (programa infantil da Globo dos anos 1990), nasceu a Mamakoosa TV, no YouTube. A intenção inicial era criar produtos com os personagens Cícero (um lobisomem nordestino), Zebu (um demônio), entre outros, para vender para produtoras que desenvolvessem a ideia. Mas a venda não se concretizou e o canal passou a ser um laboratório de experimentação. Um desses programas era a Banca do Cícero – uma banca de jornal especializada em quadrinho nacional e administrada pelo lobisomem. Para tanto, compraram e reformaram uma banca de jornal decadente que passou realmente a vender quadrinho nacional e servir de cenário para os vídeos. Depois de ser assaltada várias vezes, a ideia da banca física foi abandonada, como nos conta o Chico Paschoal no Barca Furada Cast:
Hoje as aventuras de personagens como a Pastora Zebu, Dona Morte, Blue, Leiloca, Múmia, além do Cícero e do Zebu, estão em centenas de vídeos no Tik Tok da Mamakoosa. Mas essa galera não está só viralizando vídeos curtos. O principal trabalho desses personagens é produzir e divulgar o quadrinho nacional. Com o Zebu na cadeira de Diretor Executivo e o Cícero na função de Editor Chefe da Editora Mamakoosa, o coletivo começou a lançar seus próprios gibis. No site deles você pode comprar o PDF de tudo que eles já fizeram até aqui por um preço ridículo de barato.
Alguns ds títulos da Mamakoosa tem nomes de peso no roteiro e na arte, como o PJ Kaiowá, que já fez diversos trabalhos para o mercado norte-americano, e no coletivo trouxe a ficção futurista Trato Sujo. Outro que também produziu histórias para o mercado norte-americano é o Victor Moura, que já trabalhou com o Ziraldo. Para o coletivo, ele trouxe a maior parte da sua produção independente, com títulos como Bartolomeu (vencedor do prêmio LeBlanc de 2019), Bravos, Argos e O Gabinete do Dr. Caligari (adaptação do filme de 1920), e os títulos Apocalipse Cordel e Abiã que contam com os roteiros de Chico Paschoal.
Caio Gomes contribui com sua produção autoral Jimmy Boy, e em parceria com Chico Paschoal ilustra S.T.A.B. e o genial Carga Infernal. Gabriel Billy (roteiro) e Thiago Lima (arte) apresentam uma liga de personagens da literatura brasileira em Ignotos. Letícia Pusti participa com seus reflexivos Sinceridade e Ponto de Partida.
Em 2021 eles lançaram dois volumes impressos, o Abiã (as três primeiras edições) e o Almakoosa, o almanaque da editora, apresentando boa parte das primeiras edições do material que está no site. Mas o caminho é difícil, já que eles optaram por não depender de um distribuidor e nem dar dinheiro pra Amazon. Tudo depende do boca a boca e da recepção do público.
Mas o material é bom? Vale o investimento?
Sim! Chico Paschoal e Victor Moura como roteiristas são muito criativos e hábeis. Os textos do Almakoosa que preenchem os espaços entre as histórias (horóscopo, catecismo, apresentações), são bem divertidos. No site do coletivo tem vários livros de histórias curtas de Pachoal. O cara é uma fábrica de ideias! A arte do Victor é muito forte, uma mistura de cordel com Mike Mignola. O trabalho do PJ Kaiowá é deslumbrante. A parceria entre Chico Pachoal e Caio Gomes em S.T.A.B, mas principalmente em Carga Infernal deixa o leitor querendo mais.
Meu TOP 3 até aqui:
Carga Infernal – Um lobisomem cearense e um vampiro baiano dividem um caminhão, transportando cargas pelo Brasil (o lobo dirige de dia e o vampiro de noite).
Abiã – Um crime envolvendo exorcismo intriga a polícia carioca. As investigações apontam para uma trama que conecta a Ditadura Militar e o Anti-Cristo.
Ignotos – Um time de personagens da literatura brasileira – Dr. Alpha (criado por Oswaldo Silva em 1905), Macário (criado por Alvares de Azevedo em 1852), Oscar (criado por João do Rio em 1910), Esphinge (criado por Coelho Neto em 1908), Simplício (de A Luneta Mágica de Joaquim Manuel de Macedo, criado em 1869) e Funesta (de A Rainha do Ignoto de Emília de Freitas em 1899), entre outros, numa aventura entre os mundos ficcionais.
Pra quem ficou interessado, as edições impressas você encotra na livraria Blooks. E espalhem a notícia!